quarta-feira, 14 de junho de 2017

Sobre a "Divisão do Trabalho Social" em Durkheim.












Émile Durkheim em sua obra Da Divisão do Trabalho Social, propõe um análise acerca da importância da divisão do trabalho para o desempenho da organização social. Destacando a divisão do trabalho como um fenômeno social e distinguindo o seu método de análise da sociedade dos métodos moralistas, que comumente atribuíam às regras morais o fundamento da organização social, o sociólogo francês, ao contrário, demonstra a objetividade da divisão do trabalho, sua realidade social como “condição necessária do desenvolvimento material e intelectual das sociedades” (Durkheim).
Ao destacar a divisão do trabalho como realidade, parte para o entendimento da necessidade social que ela corresponde. Qual a sua função ou, a que se presta. Assim, descobre que o caráter moral da civilização é vulnerável diante dos seus progressos, mas que a mesma não é imoral. Durkheim destaca, entre os elementos que compõem a civilização, o elemento econômico, como um exemplo de atividade que corresponde a necessidades que não são morais. E a ciência como o único elemento, que em certas condições, apresenta um caráter moral. O desenvolvimento intelectual se torna um dever para os indivíduos nas sociedades, nas quais surgem com o desenvolvimento, uma necessidade, no campo da consciência social e individual, de conhecimentos ou verdades científicas que todos devem assimilar e possuir. Essa necessidade garante o progresso e as mudanças necessárias na sociedade, e por isso, justifica sua relevância na vida coletiva.
A divisão do trabalho não será apenas a fonte única do desempenho social, mas também de uma suposta solidariedade social. E que a mesma extrapola a idéia de um fenômeno puramente econômico, que diz respeito apenas as estruturas e o meios de produção de uma sociedade, mas que é a condição necessária para todas elas. Essa divisão contínua dos diferentes trabalhos humanos torna a organização social ou o organismo social cada vez mais complexo.
Examinando a solidariedade social produzida pela divisão do trabalho, ou ainda, a sua validade para a integração social, para coesão social, Durkheim descobre que a solidariedade é um fenômeno moral e que por isso é intangível. Procura então algo que simbolize fora dos indivíduos essa solidariedade, esse sentimento que integra o escopo social. Descobre o direito como o símbolo desse sentimento intangível, que se manifesta fortemente inclinando os homens uns para os outros.
Quanto maior o número de relações entre os homens, maior será proporcionalmente o número de regras jurídicas que as determinam. Assim o direito seria a organização estável e precisa da sociedade. O direito tem origem nos costumes, e algumas relações podem simplesmente escapar as determinações do direito, mas isso são casos excepcionais. Por outro lado, o direito reproduz as formas principais da solidariedade social. O método durkhemiano consiste em categorizar as diferentes espécies do direito e, a partir dessas categorias, descobrir quais são as diferentes espécies de solidariedade social que cada uma delas correspondem.
Para Durkheim existem duas espécies de regras jurídicas: as de sanções repressivas, que dizem respeito ao direito penal. E as de sanções restitutivas, que correspondem ao direito civil, comercial, administrativo, processual e constitucional. Todas elas garantindo a coesão social.
A solidariedade social que representa o direito repressivo é aquela cuja a sua ruptura, ocasionada por qualquer agente constitui o crime. Definindo a acepção crime, como atos universalmente reprovados pelos membros de cada sociedade, Durkheim descobre um elemento que se encontra em todas as consciências individuais. O crime é capaz de gerar sentimentos em todas as consciências, os sentimentos coletivos que correspondem a um crime são medidos pela sua intensidade média.  Isso demonstra o efeito refratário do direito penal, ou das sanções repressivas. O crime é, pois, caracterizado por determinar a pena. E essa pena é uma reação passional da sociedade em punir o seu agente, isso é uma característica própria das sociedades menos cultas, nas quais as sanções repressivas são mais comuns. Através da natureza dos sentimentos coletivos que a pena é explicada.
 Nas sociedades mecânicas a consciência coletiva exerce poder de coerção sobre os indivíduos. Nessas sociedades os indivíduos se identificam, por similitudes, crenças e sentimentos em comum, que ligam o indivíduo a sociedade. É essa solidariedade mecânica que o direito penal exprime. Ela é o produto das similitudes sociais, e tem por efeito manter a coesão social que resulta dessas similitudes. Do mesmo modo é o objetivo da pena, que é manter a consciência comum, concentrando e aproximando as consciência honestas.
Já as sanções restitutivas constituem outro tipo de solidariedade. Elas exprimem uma solidariedade que Durkheim chamou de orgânicas. Que diferente das penais que são expiatórias, elas são de restauração. Elas se distanciam da consciência comum, base vital da solidariedade mecânica, e quanto mais se distancia dessa consciência comum, mais precisa se especializar, mais precisa de instituições especializadas para se manter na sociedade.
Por ser estranho a consciência comum esse direito, o qual representa as sanções restitutivas, não afeta imediatamente a sociedade. Ele se estabelece entre litigantes sem a mediação social afirmando que a regra é coisa social e que age no sentido de se restabelecer através do litígio. Uma norma fora perturbada e deve ser restabelecida. A ação social não apenas cria a norma ou a regra, mas é da sociedade que vem sua legitimidade. Por trás de todo e qualquer contrato está a sociedade a reconhecer a validade do mesmo.
Por fim, as relações do direito restitutivo se manifestam sob duas formas: negativas as quais se reduzem a pura abstenção. E Positivas que redundam em cooperação. A elas correspondem duas espécies distintas de solidariedade social. As relações negativas expressas juridicamente sob o nome de direitos reais ligam as coisas às pessoas. “Ela não faz com que as vontades se movam em direção a fins comuns, mas apenas que as coisas gravitem com ordem em torno das vontades” (DURKHEIM, 2010, p. 91).
O direito típico do conjunto dos reais é o direito a propriedade e suas variações, direito esse que por ser a base da organização social estabelecida é tido como dogma, e, portanto não carece de consenso. Como não há consenso não existe lugar, também, para o dissenso, esses direitos isolam os indivíduos, vedam o concurso entre eles em função de sua função social que é resguardar as relações conservadoras entre as coisas e as pessoas.
As relações pessoa/pessoa do tipo negativo nada mais são do que outro tipo de relação coisa/pessoa. Pois só ocorrem quando o isolamento entre os indivíduos relacionados a coisas se rompe. Nesse momento as pessoas entram em cena para restaurar as relações coisa/pessoa. O concurso que há é aparente, pois é ocasionado com o fim de se restabelecer a abstenção.

A solidariedade negativa não é um tipo real de solidariedade, mas sim o lado negativo da solidariedade. Desse modo só pode existir em sociedades onde exista sua contra parte a solidariedade positiva. Ambas tem por função o bom funcionamento do organismo social. A primeira é uma espécie de acordo externa que supõe a coesão orgânica, enquanto a segunda é a resultante e a condição dessa coesão. 

A solidariedade de tipo positivo, típica do direito cooperativo, é a que promove e surge do concurso entre os indivíduos, manifesta-se no direito que se ocupa da divisão social do trabalho em qualquer que sejam os seus graus e formas, temos como exemplo: os direitos doméstico, contratual, comercial, processual, administrativo e constitucional.

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